Nick Wadley estudou pintura e História da Arte, foi
chefe do departamento de História da Arte na Chelsea School of Art, em Londres.
Como historiador de arte, escreveu sobre pintura e desenho do século XIX. Contribui com
artigos para catálogos, revistas literárias e publicou uma série de livros,
dentre eles Man + Doctor. Esse é um
livro de desenhos produzidos entre 2004 e 2010, grande parte deles foi
produzido na cama de um hospital em Londres. Muitos dos desenhos nos trazem a
sensação de que o artista busca "evitar" o tratamento médico, aceitar
a manipulação do próprio corpo e compreender a relação estabelecida no ambiente
hospitalar. É através da atribuição de sentidos que podemos notar como o
artista pôde se manter numa espécie de equilíbrio, longe da solidão, encarando
os medos e as incertezas.
Grande parte dos desenhos demonstram impaciência e muito insegurança. O primeiro desenho não possui descrição, ele fala por si só.
Grande parte dos desenhos demonstram impaciência e muito insegurança. O primeiro desenho não possui descrição, ele fala por si só.
O
paciente encontra-se numa sala de espera e, pela porta, os médicos observam o
senhor de olhos atentos e mãos cruzadas, o corpo que quer se fechar. Ao lado,
uma mesinha e mais nada, a solidão que o acompanha. O segundo desenho,
"consultation", reproduz o consultório do médico. Nota-se uma relação
assimétrica, de um lado o doutor de postura ereta, braços cruzados demonstrando
firmeza, na parede muitos diplomas - como que se reafirmasse o papel de
"detentor de saber". Por outro lado, o paciente continua com as mãos
cruzadas, curvado, sentado, com olhos de dúvida e preocupação, olhando para
cima, para a face do médico.
Na terceira produção a gradação continua, o
paciente começa a se despir, "man in underwear", como se estivesse
olhando para o médico, ele olha para trás e fica apenas com uma peça de roupa -
que desaparece no próximo desenho. O ambiente se abre novamente, o paciente não
é o foco do desenho. A sala vazia aparece, temos o médico, uma enfermeira e o
paciente nu à sua frente - na maca -, um ambiente tipicamente hospitalar - sem
muitos objetos e cores. Os braços do paciente ficam voltados para baixo numa
posição que o deixa vulnerável ao toque do outro.
Essa questão da vulnerabilidade aparece em muitos outros desenhos. Em
"examination", por exemplo, o médico toca o paciente, a enfermeira de
braços cruzados sorri. É interessante notar que a boca do paciente aparece
aberta, os olhos bastante abertos e atentos. Nota-se que o paciente precisa ter
uma confiança enorme no médico, algo muito difícil quando este, na maioria das
vezes, é um desconhecido.
Bom, resolvi escrever esse post
porque muitas questões relacionadas a linguagem e saúde rondam os meus
pensamentos há algum tempo. Talvez um dia escreva um ensaio na tentativa de
fazer uma leitura bastante minuciosa dos desenhos de Nick Wadley.
Compreendo a produção artística como uma forma
de expressão do eu. Acredito que o ato de desenhar permite que o indivíduo
(re)construa e (re)invente seus sentimentos e conhecimentos, de maneira que
seus traços possam revelar suas angústias, seus medos e também suas alegrias.
Meu desejo é compreender esse movimento de pensar
e sentir na feitura dos desenhos e em
tantas outras formas de expressão. Outro desejo é que as relações entre médico e paciente melhorem, que as consultas durem mais do que 10 minutos e que possamos nos sentir respeitados de verdade.