sexta-feira, 15 de novembro de 2013

A linguagem do desenho: uma história de poucas palavras repleta de significados


          Nick Wadley estudou pintura e História da Arte, foi chefe do departamento de História da Arte na Chelsea School of Art, em Londres. Como historiador de arte, escreveu sobre  pintura e desenho do século XIX. Contribui com artigos para catálogos, revistas literárias e publicou uma série de livros, dentre eles Man + Doctor. Esse é um livro de desenhos produzidos entre 2004 e 2010, grande parte deles foi produzido na cama de um hospital em Londres. Muitos dos desenhos nos trazem a sensação de que o artista busca "evitar" o tratamento médico, aceitar a manipulação do próprio corpo e compreender a relação estabelecida no ambiente hospitalar. É através da atribuição de sentidos que podemos notar como o artista pôde se manter numa espécie de equilíbrio, longe da solidão, encarando os medos e as incertezas. 
            Grande parte dos desenhos demonstram impaciência e muito insegurança. O primeiro desenho não possui descrição, ele fala por si só.

           O paciente encontra-se numa sala de espera e, pela porta, os médicos observam o senhor de olhos atentos e mãos cruzadas, o corpo que quer se fechar. Ao lado, uma mesinha e mais nada, a solidão que o acompanha. O segundo desenho, "consultation", reproduz o consultório do médico. Nota-se uma relação assimétrica, de um lado o doutor de postura ereta, braços cruzados demonstrando firmeza, na parede muitos diplomas - como que se reafirmasse o papel de "detentor de saber". Por outro lado, o paciente continua com as mãos cruzadas, curvado, sentado, com olhos de dúvida e preocupação, olhando para cima, para a face do médico.

           Na terceira produção a gradação continua, o paciente começa a se despir, "man in underwear", como se estivesse olhando para o médico, ele olha para trás e fica apenas com uma peça de roupa - que desaparece no próximo desenho. O ambiente se abre novamente, o paciente não é o foco do desenho. A sala vazia aparece, temos o médico, uma enfermeira e o paciente nu à sua frente - na maca -, um ambiente tipicamente hospitalar - sem muitos objetos e cores. Os braços do paciente ficam voltados para baixo numa posição que o deixa vulnerável ao toque do outro. 
           
           Essa questão da vulnerabilidade aparece em muitos outros desenhos. Em "examination", por exemplo, o médico toca o paciente, a enfermeira de braços cruzados sorri. É interessante notar que a boca do paciente aparece aberta, os olhos bastante abertos e atentos. Nota-se que o paciente precisa ter uma confiança enorme no médico, algo muito difícil quando este, na maioria das vezes, é um desconhecido.
             Bom, resolvi escrever esse post porque muitas questões relacionadas a linguagem e saúde rondam os meus pensamentos há algum tempo. Talvez um dia escreva um ensaio na tentativa de fazer uma leitura bastante minuciosa dos desenhos de Nick Wadley. Compreendo a produção artística como uma forma de expressão do eu. Acredito que o ato de desenhar permite que o indivíduo (re)construa e (re)invente seus sentimentos e conhecimentos, de maneira que seus traços possam revelar suas angústias, seus medos e também suas alegrias. Meu desejo é compreender esse movimento de pensar e sentir na feitura dos desenhos e em tantas outras formas de expressão. Outro desejo é que as relações entre médico e paciente melhorem, que as consultas durem mais do que 10 minutos e que possamos nos sentir respeitados de verdade.