segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Autobiografia Sumária de Adília Lopes

Os meus gatos
gostam de brincar
com as minhas baratas
(LOPES, 2002 em Antologia. P.71)



            Antes de iniciar a minha tentativa de “análise” do poema “Autobiografia Sumária de Adília Lopes” – da poetisa contemporânea que é o pseudônimo literário de Maria José da Silva Viana Fidalgo de Oliveira – gostaria de dizer que quando estudei essa poetisa logo me apaixonei pela sua poesia. Depois que li alguns textos e fui adentrando o seu mundo literário, então... nem se fala!

            Dotada de um estilo muito peculiar, Adília utiliza diversos elementos narrativos em seus poemas, ora predominando nas repetições, ora infantilizando-os – como é o caso do uso do verbo “brincar” neste poema. Também é constante o uso de figuras animalescas, como neste caso – gatos e baratas. 

            Logo no primeiro verso Adília diz: “Os meus gatos”. Ou seja, não é qualquer gato, é o gato dela. Sabendo que o gato é um animal com certa simbologia, que ora oscila entre tendências maléficas e benéficas, em diferentes culturas, há certo mistério que se insere na figura do gato, e que pode ser facilmente relacionado à figura de Adília, que ao mesmo tempo é Maria José. Portanto, não à toa que tal figura está em sua “Autobiografia”.

            A barata, por sua vez, é a segunda figura animalesca que aparece no último verso do poema de Adília: “com as minhas baratas”. Esta representará aquilo que está à margem, a hipocrisia social ou a solidão. Como sabemos, para a produção de um artista a solidão é indispensável para sua reflexão e criação artística.

            É possível identificarmos que Adília une dois extremos, a barata – que naturalmente não é vista com bons olhos pelas pessoas, por ser relacionada à sujeira –, e o gato – facilmente cultivado como animal de estimação por grande parte das pessoas. Por esta simples metáfora, a poetisa nos transmite a idéia de que o ocultismo do gato e a solidão da barata acabam se completando, assim como as pessoas são constituídas por pólos diferentes, como Maria José e Adília, que são uma só. 

            Neste sentido começamos a perceber que há uma luta contra um discurso do senso comum, onde as pessoas podem viver sem seguir um padrão que limita as vontades próprias. O apreço por animais tidos pelo senso comum como repugnantes e indignos de admiração – como é o caso da barata – faz parte do esforço em fugir das convenções sociais e psicológicas vigentes.

            Enfim, percebe-se que Adília Lopes, mesmo com sua escrita aparentemente simples, é capaz de fazer uma profunda análise da vida cotidiana do ser humano, da qual fazem parte diversos elementos – inclusive baratas. Através dos seus escritos, Adília faz suas denúncias, desenvolve suas descrições alternativas e se distancia da crueldade legitimada de tantas formas. Fugindo dos padrões, utilizando uma sintaxe quase que incompatível com a escrita poética, utiliza os animais como muito mais do que simples substantivos.         

         "Por um lado, os bichos – e eu gosto muito de bichos – serão queridas baratas. Mas não há rostos baratos. Não há caras caras e caras baratas. Vivemos num momento em que as pessoas fazem muitas operações plásticas ou gastam muito dinheiro com a aparência e eu acho isso um logro.” 

            Diante desta nossa última citação fica claro que Adília Lopes se utiliza da arte como forma de elaborar severas críticas à sociedade que lhe é contemporânea. Desse seu esforço crítico, nos é legada uma rica fonte de reflexões – inclusive sobre a linguagem.



A poesia  deve ser apresentada como
uma   forma   de   refletir   e   repensar 
o seu vocabulário final


 

quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Uma Prova de Amor


         
"Mãe lembra quando eu fui para um acampamento de férias?
Eu estava morrendo de medo de não ver mais vocês,
e você me disse pra sentar do lado esquerdo para
que eu pudesse ver vocês?
Então, estarei neste mesmo assento."

         Ultimamente tenho assistindo um filme mais emocionante do que o outro. Poderia pensar que é por estar vivendo longe do meu país, da minha família e dos meus amigos, mas não! Por mais sentimental que eu seja/esteja o filme que assisti ontem foi um dos mais belos que assisti nos últimos anos. 
             “Uma Prova de Amor” retrata o drama de Kate – uma jovem menina que tem leucemia. Sara e Brian – seus pais – fazem de tudo para que o quadro da doença seja revertido. Quando se veem sem possibilidades são aconselhados por um médico a fazer uma fertilização in vitro para que a criança gerada seja doadora de Kate. Os pais concordam e nasce Anna que desde bebê passa a doar sangue, células tronco do cordão umbilical, e faz tudo o que é preciso para prolongar a vida de Kate.  Aos 11 anos de idade Anna precisa doar um rim para sua irmã, cansada dos procedimentos médicos a garota decide enfrentar os pais dizendo que ela deve decidir o que fazer com o seu corpo, e então, contrata um advogado para defendê-la. Sara não se conforma com a ação judicial, e como estava acostumada a ganhar todos os casos quando exercia a advocacia, decide a todo custo manter Kate viva. Há ainda o irmão Jesse, que se vê cada vez mais ignorado pelos pais e apoia sua irmã – Anna.
                O filme é narrado por seus vários “protagonistas”, desde a própria Anna até a Kate – que em sua situação de dor e sofrimento – demonstra uma maturidade incrível ao lidar com as mais variadas situações. Kate – que passa por essas circustâncias quase toda a vida – consegue enxergá-la de uma maneira muito profunda – se diverte quando é possível, chora e fica triste como todo ser humano, namora e ama. Enquanto isso – no tribunal – Anna não só sensibiliza a juíza que havia perdido uma filha fazia poucos meses, como se coloca em frente a mãe e argumenta sobre o seu direito de decidir se irá ou não doar o rim para Kate.  Jesse invade a sessão – e mesmo com Anna implorando para que ele não dissesse nada –  relata que todo o processo foi aberto porque Kate queria morrer desde o início, e que só os dois irmãos a ouviam.
                 O momento de fortissima emoção é quando todos vão até o hospital onde Kate está internada. Ela se despede da família dizendo que os ama e deixa um álbum de fotos com sua mãe a  pessoa que luta o tempo todo pela sua vida , sendo a verdadeira prova de amor de uma mãe que sofre ao ver sua filha doente e impossibilitada de fazer algo. A jovem bastante debilitada vai a óbito naquele mesmo dia. Sara compreende que somente ela não queria ouvir o que Kate dizia. Por que ela não queria ouvir? Eram palavras duras demais? Sim! Nenhuma mãe quer se conformar em perder uma filha, isso é claro! Mas será que ouvir e procurar refletir sobre aquilo que foi dito não é a melhor maneira de encontrar um alívio para prossseguir a vida e lidar com a situação? Seja lutando, seja conformando-se, seja vivendo… Seja observando que a morte nos ensina sobre a transitoriedade de todas as coisas...