“Adoramos a perfeição,
porque não a podemos ter;
repugna-la-íamos, se a
tivéssemos.
O perfeito é desumano,
porque o humano é
imperfeito.”
(Fernando
Pessoa)
Quando a Juliana nasceu, a
primeira coisa que os médicos disseram foi: -“ Ela é perfeita!”. Nascera com
quase quatro quilos, rosadinha, seu coraçãozinho batia forte, seus dedinhos
pegavam o meu polegar com vontade! Era linda, linda, linda! Passara por todos
os exames médicos. Ali estava minha pequena, minha filha tão esperada e amada
antes mesmo de chegar ao mundo. Eu só tinha motivos para comemorar.
Os anos iam passando e a Juju só
me dava orgulho. Era disposta, brincava, dançava, pulava, correspondia a todas
expectativas. Seu cabelinho chanel sedoso, bochechas avermelhadas, olhos
brilhantes, demonstravam sua saúde rara. A vida era doce e alegre. Juju não se
queixava de nada, nunca. Era uma criança felicíssima... E normal, como não
poderia deixar de ser... Chorava, não queria comer verduras e legumes, caia de
bicicleta. E era isso tudo que fazia ela ser a criança mais perfeita que eu já
conheci.
Foi na 1ª série que a professora
de Juliana me procurou para perguntar o que estava acontecendo com a minha
pequena. Eu fiquei muito surpresa! Minha linda sempre foi muito sapequinha!
Será que ela aprontou alguma coisa na escola? O que será que aconteceu? Embora
eu tivesse que trabalhar durante todo o dia, procurava me manter o mais próxima
possível de todas as atividades da minha filha. A vida não é fácil! Chegando na
escolinha a professora Bete diz: “–
O que está acontecendo com a Juju,
mamãe? Ela anda tão aérea, parece estar no mundo da lua... Não está
acompanhando a aula, fica sozinha no recreio...
Na hora de dormir eu fui até a
caminha da minha pequena pra conversar. O que está acontecendo, meu bem? Fala com a mamãe. Ela caiu aos prantos e
disse: “– Eu não sei, mamãe! Não consigo
aprender nada, meus amiguinhos já não gostam mais de mim. Todo mundo acha que
eu sou burra!
Fiquei desesperada. O que fazer
pra ver minha menina sorrir novamente? Como deveria agir naquele momento?
Comecei a procurar os médicos. Fui ao psicólogo, neurologista, psicopedagogo...
“– Fique tranquila! É uma fase
passageira!”, “Ela ainda não se adaptou a escolinha”... “Talvez ela sinta falta
do pai”. É, eu sei. Ser mãe solteira não é fácil. Mas o que eu poderia
fazer? Cada dia que passava Juliana inventava uma desculpa para não ir à
escola. Já estava sem ânimo para fazer qualquer atividade...
Aquele ano foi muito difícil...
Juliana repetira de ano e isso fazia com que ela se sentisse cada vez mais
triste. Comecei novamente uma investigação. E dessa vez, não cessaria sem saber
o que o meu tesouro mais precioso tinha. Depois de muitos exames, aquela menina
que nascera com a marca de “ela é perfeita” tinha um “defeito de fabricação”.
Minha lindinha poderia ter os melhores estímulos possíveis, e mesmo assim os
médicos não poderiam garantir que ela acompanhasse as crianças da idade dela.
“– Ela tem dislexia”, a
médica disse. Eu nem sabia do que se tratava. Doutora Virgínia me disse que dislexia é uma dificuldade de aprendizado
da Linguagem: em leitura, soletração, escrita, cálculos matemáticos.... E que
não tem nada a ver com falta de interesse, de motivação, de esforço ou de
vontade. Confesso que essa notícia
partiu o meu coração. Tudo o que eu mais queria na vida era ver a minha filha
feliz, muito feliz. Como seria sua vida daqui em diante? Ela seria capaz de
levar uma vida “normal”?
Comecei a refletir sobre a “perfeição”. O que
precisamos pra ser perfeitos? Ser perfeito é o ideal? Penso que a perfeição é
sempre um sonho, e sonhos podem nos ajudar a construir a nossa vida e alcançar
a felicidade. Mas pra ser feliz temos mesmo que ser perfeitos? O jeito é não perder a
esperança! Mas como meu tesouro viveria sabendo que suas limitações poderiam (talvez)
tornar seus sonhos inviáveis?
Os anos foram se passando e Juju
se saia muito bem nas atividades desenvolvidas à ela. A escola e eu fizemos um
acordo de cooperação nessa longa jornada – o que foi muito importante! Um belo
dia eu pude concluir que minha filha é humana, e por isso, não poderia ser
perfeita. E eu continuarei amando-a assim – cada vez mais – se é que isso é
possível. Agora havia descoberto que a dislexia era uma maneira de ser e de
aprender; era a forma que minha filha mostrava sua expressão singular, mostrava
que era uma menina genial que também tinha muito para ensinar – além de
aprender.
Aprendi que a perfeição não é um
padrão a ser seguido. Aprendi que nem todas mulheres gostam de rosa, como nem
todos os homens gostam de azul. Aprendi que o bom da vida é viver cada momento
desvendando sua mais pura cor. Aprendi que o caminhar é um dégradé maravilhoso. Que no início do dia o céu é cinza, mas pode
ser azul. Que ao meio dia pode estar chovendo, mas podemos enxergar um lindo
arco-íris no horizonte. Que no final do dia o céu vai ficando avermelhado nos
mostrando a cor do sentimento mais nobre que existe: o amor.
***
Thaysa, adorei. Escreves muito bem, tens uma prolífica imaginação e um lirismo exorbitante. Gostei em demasia.
ResponderExcluirBeijão.
Tamberg! Muito obrigada pelos elogios!
ResponderExcluirMas minhas impressões em relação ao seu poema também foram as melhores possíveis. És um grande escritor! Um beijo.
Que belíssimo texto, Thaysinha, que pureza nas palavras e que jeito você leva para escrever, menina! Prossiga, Thaysa, prossiga... Lindas palavras... Ficarão em minha mente... Um beijo, Dre (debrinha).
ResponderExcluirDebri! Muito obrigada! Ultimamente tenho lido e escrito muito! E isso tem me feito um bem danado... É uma terapia! Sempre que quiser, apareça por aqui! Beijo beijo!
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